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sexta-feira, 22 de março de 2013

Sociedade Anônima versus Sociedade por Ações


Por Rodrigo B. Fontoura


As iniciais S.A, desde sempre, significam para o mundo empresarial a abreviação da expressão Sociedade Anônima, correto? Isso é o que pelo menos 80% das pessoas, entre leigos, empresários e operadores do direito sempre tomaram como verdade absoluta. Ao abrir o texto da Lei nº 10.406, de 2002, acadêmicos de direito vislumbram a expressão Sociedade Anônima como se estivessem lendo o projeto de 1975, que originou o atual Código Civil Brasileiro. Eu mesmo, ao ler o atual Projeto de Lei nº 1.572, de 2011, que dispõe sobre o projeto do novo Código Comercial, tive sensação parecida: Lá estava, brilhante qual ouro de tolo, a expressão Sociedade Anônima, utilizada com o peculiar desapego dos práticos e postada incólume sobre a letra fria da lei. Muito bem. Minha intenção neste artigo é demonstrar em um silogismo simples que as Sociedades por Ações substituíram as Sociedades Anônimas, para fins de boa-fé e de ética social, como tipo societário titular da expressão S.A, apesar do costume integrado pelo uso cotidiano.

No início dos anos 90, entre as situações "imexíveis" do outrora ministro neologista e a inusitada atuação dos "caras-pintadas", o governo do então presidente Fernando Collor de Mello promulgou a Lei nº 8.021, de 1990, que dispôs, entre outras coisas, sobre a vedação ao pagamento ou resgate de qualquer título ou aplicação, bem como dos seus rendimentos ou ganhos, a beneficiário não identificado. Referida lei, outrossim, mudou o então vigente artigo 20 da Lei nº 6.404, 1976, instituindo a obrigatoriedade das ações, na condição de valor mobiliário representativo do capital social das empresas, passarem a ser nominativas. A citada lei, ainda, demandou a seguinte imposição: "As sociedades por ações terão um prazo de dois anos para adaptar seus estatutos ao disposto no artigo anterior."

Deste modo, a emissão de títulos ao portador, inclusive e principalmente ações, conforme depreende-se do texto legal acima mencionado, foi expressamente vedada pela legislação. Na prática, desde 1990, a emissão de ações ao portador foi terminantemente proibida, passando todas as ações de emissão das sociedades a serem nominativas, isto é, em cuja face deveria constar o nome do seu titular.

A expressão anônima não mais descreve a natureza das sociedades por ações

Isso, à época, acabou por conciliar dois interesses: o interno, no Brasil, que era o de identificar os contribuintes para fins fiscais; e o externo, no exterior, que era o de combater a lavagem de dinheiro e o financiamento de atos ilícitos - leia-se o financiamento de guerrilhas ou o fomento à constituição de governos de caráter socialista - mascarado pelo anonimato de milhares de Sociedades Anônimas existentes pelo mundo. Tinha-se, com isso, um conceito de anonimato atrelado à ilicitude, seja em égide de evasão fiscal ou até mesmo de terrorismo.

Sem entrar no mérito do pano de fundo que norteou citados atos, o fato é que a condição de Sociedade Anônima exige, antes de tudo, anonimato. Nesse diapasão, assim são as Sociedades Anônimas do Panamá, as Safi - Sociedades Anônimas Financeiras de Investimento - uruguaias e até mesmo as offshores constituídas até 1994 em BVI, cujos títulos emitidos são efetivamente ao portador, ou seja, pertencem a quem as portar, e a ninguém mais.

Destarte, percebe-se que a expressão "anônima" efetivamente não mais descreve a verdadeira natureza das sociedades por ações. É por isso que a Lei nº 6.404, de 1976 denomina-se Lei das Sociedades por Ações, embora de seu texto não atualizado ainda conste a expressão Sociedade Anônima.

A verdade é que nos dias de hoje e, cada vez mais, o anonimato permanece como um conceito ligado à ilicitude, seja diretamente ou mesmo indiretamente, através dos chamados "laranjas". Prova de que isso tende a acabar é a criação das Empresas Individuais de Responsabilidade Limitada, que vieram justamente para extinguir as sociedades proforma, constituídas apenas para cumprir formalidades legais. Desta feita, percebe-se essa tendência no próprio legislador, que busca corrigir as lacunas que deixou, evitando a perpetuação de seus erros.

Conceitos fundamentais e cada vez mais relevantes em nossa sociedade, como a boa-fé objetiva nas relações contratuais societárias e a função social da empresa, corroboram ainda mais com o sentimento de que, no mundo de hoje, não há mais espaço para atuar em anonimato. Sendo assim, por que insistir em manter-se uma denominação que virtualmente depõe contra o espírito atual de nossas companhias, como veículos de circulação de riquezas que conciliam suas atividades baseados no equilíbrio difícil, mas necessário, entre empreendedorismo e sustentabilidade?

Assim, substituindo-se a expressão Sociedade Anônima pela expressão Sociedade por Ações, entendo que as pessoas devam passar a se identificar com muito mais afinidade ao espírito da lei. Afinal, devemos todos os dias ser representantes da conduta de comissão e não da de omissão, em uma sociedade que deve prezar pela ação, e não pelo anonimato.

Fonte: Valor Econômico.

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