Além da Euforia: a “Teoria da Metade Vazia do Copo” da Economia Brasileira
Quem já se excedeu etilicamente em uma festa conhece a inexorável realidade de que o amanhecer virá acompanhado de uma terrível ressaca. Mas e se a festa não tivesse fim? Nesse caso, os sábios conselhos do Engov e da moderação soariam como caretice. Em um mundo de pernas para o ar, o Brasil está curtindo a festa ao ritmo dos tambores do ufanismo e do bordão "nunca antes na história deste País". Em "Além da Euforia", os renomados pesquisadores e professores Fábio Giambiagi e Armando Castelar Pinheiro reconhecem os avanços do Brasil em várias frentes desde 1990, mas não sem alertar para as falhas e os perigos do modelo de desenvolvimento adotado.
O livro dedica um capítulo a cada desafio, cobrindo desde a baixa produtividade do Brasil até a falta de poupança interna e a carência de infraestrutura. O estilo do livro se assemelha ao dos artigos técnicos, com argumentos firmemente ancorados em dados concretos, organizados em tabelas e gráficos. Apesar da tecnicidade dos conceitos econômicos apresentados, a leitura é leve e tem pitadas de bom humor introduzidas por inúmeras citações de personalidades famosas.
Nas palavras de John Kennedy, "a melhor época para consertar o telhado é quando o tempo está bom". No entanto, grandes transformações na economia brasileira só ocorreram em períodos de crise. O lado "cigarra" da natureza humana nos torna avessos a mudanças em tempos de bonança, tanto individualmente quanto coletivamente. O reconhecimento desse fato provoca uma sensação incômoda de que estamos, como sociedade, esperando pela próxima crise para avançar em assuntos polêmicos.
Tomemos o tema dos gastos com seguridade social, por exemplo. Temos testemunhado essa discussão como pano de fundo para a crise europeia. Estima-se que o envelhecimento da sociedade brasileira deverá multiplicar por 3,5 vezes o número de adultos acima de 60 anos em 2050. Quando vamos lidar com esse e outros desafios? O sistema atual, que combina aumentos do salário mínimo acima da inflação, baixa idade para aposentadoria e incremento na expectativa de vida, funciona como uma bomba-relógio para as gerações futuras, que deverão pagar a conta do nosso legado.
A despeito da amplitude dos assuntos abordados pelo livro, é importante ressaltar que os desafios para a sociedade brasileira vão além do modelo de desenvolvimento. Em particular, quatro temas fundamentais merecem atenção, apesar de entendermos que não deveriam fazer parte do escopo da obra: reforma política, reforma do Judiciário, sistema de saúde, e segurança.
Parodiando o ex-presidente argentino Carlos Menem, "Estamos bien, pero vamos mal" (no original, os adjetivos são invertidos). O capítulo final da obra procura renovar o otimismo natural do brasileiro, porém de forma pragmática, enviando uma mensagem às lideranças políticas e empresariais do País. Na ausência de uma crise que crie o sentido de urgência necessário para quebrar a inércia política, será preciso uma boa dose de capital político para mobilizar a classe governante na direção das mudanças que devem ser feitas. Afinal, ninguém quer tirar o ponche da sala quando a festa está esquentando.
Ótima sugestão de leitura!
Por Peter Jancso, via Revista Capital Aberto.
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