"Não Lembro de Outro Período de Tantas Mudanças"
O presidente do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), Juarez Domingues, esteve em Natal durante a semana passada para participar da posse da diretoria do Conselho Regional de Contabilidade do RN. Nessa entrevista, o contador fala sobre a importância da profissão dentro do cenário nacional e o atual momento da contabilidade no mundo. De acordo com Domingues, informações extra-oficiais indicam que, no Brasil, a contabilidade está seguramente entre as 10 principais profissões, com os profissionais sendo cada vez mais requisitados, pela contabilidade ser uma ciência da informação e os contabilistas lidam com dados que servem de base para a tomada de decisões de toda e qualquer empresa que tenha vocação para o crescimento. Para garantir a continuidade do fortalecimento da atividade, o CFC vem investindo na realização de eventos, como seminários e congressos, incluindo a busca por sediar o Congresso Mundial da Categoria no próximo ano, evento que nenhum país da América do Sul sediou até o momento e que, se confirmado, deverá reunir cerca de 10 mil profissionais advindos dos mais diversos países. Domingues estima que hoje existam no país cerca de 420 mil profissionais e 73 mil organizações contábeis, registradas junto aos conselhos regionais da categoria.
Qual o perfil do profissional da contabilidade?
Ele é um bacharel em contabilidade, denominado contador, ou um técnico em contabilidade, de nível médio. Os dois formam a categoria do contabilista e, fazendo uma analogia, podemos dizer que assim como o médico cuida da saúde dos seus pacientes, a grande missão desses profissionais é cuidar da saúde patrimonial das empresas. Quando, no início dos anos 2000, aconteceu o grande escândalo das empresas de auditoria, envolvendo companhias como a Enro e a Worldcom, em que empresas potencialmente grandes acabaram sucumbindo, houve um despertar no mundo para a contabilidade, valorizando o profissional. Essa situação mostrou que se não cuidarem bem da contabilidade, se não derem a atenção devida a essa área, uma empresa pode sucumbir. Agora, recentemente, a crise financeira mundial também teve como pano de fundo decisões que foram tomadas em outros países que não respeitaram a contabilidade, uma vez que a atividade mostrava quais eram os caminhos das situações em que estavam envolvidos principalmente os agentes financeiros e os créditos que eram concedidos para a construção da casa própria nos Estados Unidos e outros países.
Se a contabilidade tivesse sido levada em consideração com maior seriedade, a crise financeira internacional poderia ter sido evitada?
Talvez ela não pudesse ter sido evitada, mas não teria atingido o mercado na mesma proporção. O Brasil ganhou por dois anos consecutivos, o prêmio de melhor controle contábil de bancos do mundo e essa pode ser uma das razões pela qual o país conseguiu sair mais facilmente da crise. Isso fez com que a curva em outros países fosse em "U", ou seja, o nível de atividade econômica caiu, passou um tempo em baixa e só depois conseguiu uma recuperação, enquanto em países como o Brasil, essa curva foi em "V", com a atividade tendo caído, mas se recuperado rapidamente. Por outro lado, vivemos um momento de muitas transformações e eu não lembro de outro período em que tenham existido tantas mudanças na área contábil, como nos cinco últimos anos.
Que mudanças foram essas?
Dentre as principais está o fato de termos hoje as normas internacionais de contabilidade e uma aproximação da área pública. As normas internacionais são regras comuns a todos os países, que colocam no mesmo patamar a contabilidade praticada em todos eles. É como uma partida de futebol, que se o esporte praticado no Brasil fosse diferente do praticado em outros lugares, não haveria condições de promover um campeonato mundial. A adoção das mesmas regras em diferentes países melhora a qualidade do serviço oferecido, do trabalho executado e, principalmente, dá aos contabilistas brasileiros a oportunidade de colocarem no mercado internacional produtos e serviços que hoje não são possíveis por causa da dificuldade na comparatibilidade. Na prática, isso significa que o Brasil acabou perdendo espaço no mercado internacional, mesmo tendo grandes empresas e agora poderá se recuperar. Com a aplicação de normas internacionais, a tendência é que as empresas fiquem em um mesmo nível de comparação, independente do país em que estejam instaladas. Outra mudança que percebo nos últimos 10 anos é o aumento na procura do curso de contabilidade, principalmente por mulheres, que antes não existia por uma visão errada de que a profissão era a ciência dos números, mas isso foi desmistificado e o público feminino entendeu que esta é uma ciência social, voltada ao aspecto da gestão, e administrar é uma coisa que a mulher sabe fazer muito bem. Esse casamento das mulheres com a contabilidade se deu de uma forma muito especial, fazendo com que saíssemos de um percentual de 4% para 37% de profissionais do sexo feminino nesse período e acredito que a tendência é que elas ultrapassem a quantidade de homens em muito pouco tempo.
Qual a importância da contabilidade pública hoje, no Brasil?
Os entes públicos também têm que gerar resultados. A contabilidade pública sempre foi, eu diria, muito mais informativa, de preenchimento de requisito legal, do que um instrumento gerencial. Então, nesse sentido, estamos trabalhando com uma linha de aproximação muito grande com os governos, nas diversas esferas, para fazer com que os conselhos regionais e o conselho federal possam repassar as suas experiências, dando sua parcela de contribuição para que a contabilidade pública ganhe um impulso e que o gestor gerencie com base nas informações contábeis.
A lei de responsabilidade fiscal mudou a gestão pública, de alguma forma?
Para mim, essa lei foi um dos maiores avanços que nós tivemos, porque determinou alguns limites para o gestor público. Até então, não existiam níveis mais rígidos de comprometimento com a receita e a lei de responsabilidade fiscal estabeleceu quanto ele poderia gastar, ao estabelecer algumas regras. O que passou a existir de diferente foi que, em um primeiro momento, houve uma preocupação muito grande do gestor público com relação aos limites, para não fazer uma obra que não possa ser concluída, não deixando uma "herança" para os governos futuros. E isso tudo, por medo de sofrer uma punição. Mas, atualmente, mesmo com a existência da lei, o acompanhamento do gestor público ainda é muito precário.
Para quem são voltados os serviços dos contadores?
Em uma análise macro para a sociedade, nós somos fator de proteção para ela, porque registramos tudo aquilo que ocorre em uma empresa. Então, se você quiser uma fotografia da empresa, saber o que ela realizou, o que ela fez em determinado período, basta olhar para a contabilidade desta empresa. A contabilidade demonstra através dos diversos documentos contábeis, a realidade da empresa, ligada diretamente ao seu patrimônio em determinado período e isso está cada vez mais atual. Hoje, estamos trabalhando também no sentido de fortalecer o perfil do profissional, porque ele ainda é visto por segmentos como aquele profissional que aparece apenas no momento de se fazer o imposto de renda ou aquele que ajuda a dar um "jeitinho". Mas isso não existe e é uma imagem muito deturpada, às vezes apresentada por novelas e filmes. Não tenham dúvidas de que, no mundo, o profissional contábil será o mais requisitado e isso vai ser em muito pouco tempo, pois é a profissão que está apresentando o maior crescimento. Outra coisa é que hoje, dificilmente se encontra um contador desempregado, além de quem cursa contabilidade ser capaz de no primeiro semestre da faculdade já estar estagiando e bancando o próprio estudo, enquanto em cursos como medicina, a pessoa só começa a ter rendimentos após cerca de oito anos. Nós tivemos um período em que o curso de contabilidade não era tão procurado e era visto como "o que sobrava", mas saímos do estágio onde a contabilidade era uma opção e passou a ser a escolha do aluno, com algumas faculdades registrando que este é o segundo curso mais procurado. Para mim, esse é um cenário irreversível, porque enquanto existir no mundo uma empresa, haverá um contador e pensar estrategicamente é utilizar a contabilidade.
Com todos esses pontos positivos e conquistas, quais os desafios atuais da contabilidade?
São vários. Um é treinar esses contabilistas para adotar as normas internacionais, outro é aproximá-los cada vez mais da área pública, além de fazer com que a sociedade os veja no patamar a que ele faz jus. E outro ponto que considero da maior importância é a responsabilidade social, pois cada vez mais as organizações brasileiras estão se inserindo no contexto social de responsabilidade ambiental e o contador tem um papel fundamental em ações como um programa voltado a elaborar a prestação de contas da Pastoral da Criança e do Idoso. Esse foi um compromisso assumido com Zilda Arns, que recentemente morreu em um terremoto (ocorrido no Haiti), e que iremos manter.
Como estamos no período de entrega da declaração de imposto de renda, o senhor pode dar algumas dicas para que o contribuinte não cometa erros?
Primeiro, é importantíssimo contratar um contador. Esse é o grande caminho para que ele jamais erre na declaração de imposto de renda. Mas outra coisa que precisa ser levada a sério é o cumprimento das orientações dadas por ele. Dessa forma, o contribuinte vai estar seguro de que a sua declaração.
Fonte: Tribuna do Norte (por CFC).
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